terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Não Pise na Grama

"Não pise na Grama". Era o que estava escrito na plaqueta, quando cheguei no parque. Sentei em um banco qualquer e fiquei aproveitando meu recém-comprado lanche de mortadela. Enquanto dava mordidelas em meu saboroso lanche sabor mortadela, comecei a falar pausadamente a frase da grama, aquela que fala para não pisar nela. Nela, a Grama. Enquanto dividia as palavras com o lanche, ou o contrário disso, percebi o movimento que as graminhas da Grama faziam quando os sopros de Vento batiam-lhes as faces. Algo bonito de ver, todas elas se movimentando em conjunto. Todas verdinhas e apontando para o céu, achando-se o máximo por poder balançar de um lado à outro com a proteção do governo de que ninguém pisaria-lhes o corpo. Estavam tranquilas. Quando dei por mim, só restava um pedaço de alumínio em minha mão, que educadamente joguei em uma lata de lixo. Lata que provavelmente iria ser jogada um dia com todo o lixo acumulado que pensamos estar reciclando ao jogar em uma lata de lixo qualquer. O Lixo não some, nada some. Olhei novamente para as graminhas e decidi vê-las de perto, pois havia um quê de convite em seus movimentos. Levantei-me do banco, tomando cuidado com um ciclista desavisado, que insistia em olhar a parte traseira de alguma moçoila que também insistia em usar lycra, mesmo sabendo o quanto isso provoca acidentes por todo o Globo. Segui em direção ao gramado e ultrapassei a cerquinha do aviso mortal que dizia "Não Pise na Grama". Tarde demais, havia pisado. De alguma forma, pensei que sentiria alguma coisa, mas acabei por não sentir nada. Talvez fossem os sapatos, que nos separam grandemente do contato com a Terra, a terra. Descalcei-os e fiquei mexendo os dedinhos na grama, tal qual você faz quando toca a areia da praia com os pés. Estava eu mexendo dedinhos no grande mar verde que se prolongava até onde a mente tem vontade de lembrar. Estava eu sobre o mar, andando no mar. Sentei na Grama e brinquei com as graminhas. Deitei-me na Grama e as graminhas brincaram comigo. Fiz anjinho de Grama e descobri que não é nada igual a fazer anjinho de neve. As graminhas não gostam dos anjos. Tampouco dos demônios, creio. Olhei o céu e pensei ver uma nuvem em forma de Grama, mas era apenas uma graminha em meu óculos, fazendo-me rir. Ri até ficar sonolento. Adormeci no mar, velejando no verde das nuvens do sono. Viajei por lugares que não lembro, mas que me fizeram acordar com um sorriso no rosto. Acordei também com ela ao lado, deitada sobre mim. Aninhada em meu peito. Quem era? Quem era? Não queria acordá-la. Apesar de ser uma total estranha, não se acorda pessoas aninhadas em você desta forma. Seja educado, já dizia minha Mãe. Tentei mirá-la de soslaio, pois também aprendi a não encarar as pessoas. Isso foi meu Pai que ensinou. Mas acabei por encará-la descaradamente. Nunca obedeci meu Pai. Olhei seu cabelo dançando em meu corpo, ondulando sobre mim. Admirava cada detalhe de seu rosto. Uma sobrancelha que seguia o caminho de seu rosto, à encontrar o começo do nariz, que tinha um formato de bolinha, nariz de criança. Não vi muito dos olhos, pois estavam cerrados, mas batia-me mais forte o peito cada vez que pensava no momento do despertar. Sua boca entreaberta fazia-me lembrar dos morangos com creme de leite da infância, quando minha vó fazia sobremesa. Era delineada e possuía aqueles levantadinhos nos cantos, como se fosse esboçar um sorriso a qualquer momento. Algumas pintinhas aqui e acolá e uma pele muito bonita. Há quanto tempo estava observando-a? Mexi com as graminhas com a mão direita, enquanto afagava seu cabelo com a mão direita. Estranhamente, a sensação era a mesma. Era o mesmo mar de verde em minhas mãos, em meu corpo. Olhei para o céu, vi nuvens em forma de menina e de graminha, fundiam-se enquanto lentamente fechava meus olhos. Adormeçi sentindo o quente de seu corpo. Despertei. Já não há menina, apenas graminhas em ambas as mãos. O que aconteceu? Um sonho? Pesadelo? Pesadelo não, pois eu muito gostei. Sonho. Tão real, seus cabelos em meu verde mar. Levanto-me aturdido do que acontecera. Saio do gramado e calço os tênis. Leio na placa "Não pise na Grama" e entendo o significado de uma forma diferente. "Não pise na Menina", leio eu. Sento no banco, penso alguns minutos. Imagino seu calor em meu corpo. Ainda que imaginário, é bom. Levanto-me e sigo o caminho de casa, mas não sem antes retirar o Alumínio do Lixo que irá pro lixo. Guardo-o. No Parque, o mesmo ciclista machuca o joelho ao dar com uma árvore. No Parque, a mesma moçoila ajudando o ciclista machucado. O som de um navio e a luz de um farol. No Parque, a mesma plaqueta. "Não pise na Grama".

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